Caríssimos irmãos e irmãs no
santo Batismo e pessoas de boa vontade em geral a quem esta Nota Pastoral
chegar: saudações de paz e bênçãos de Deus, extensivas a todos os que lhes são
queridos.
A Igreja tem acolhido em seus
trabalhos sociais todas as situações conflitivas da humanidade e procurado
ajudar as pessoas em suas realidades. O arco de atuação é muito grande. Por
isso mesmo ela procura contribuir com reflexões em certos momentos da história
para que os caminhos da humanidade não levem a situações mais difíceis no
futuro.
É de conhecimento de muitos que
há em curso uma nova tentativa de se colocar para as nossas crianças e
adolescentes, nas escolas, o perigoso ensino – verdadeira doutrinação – da
ideologia de gênero. Faz-se, portanto, oportuno lembrar que esta ideologia foi
banida do Plano Nacional de Educação (PNE) no ano passado, graças a ingentes
esforços das mais variadas forças vivas de nosso país, que interpretaram e
respeitaram o pensamento do povo brasileiro. Também houve posicionamento de
diversos Bispos e outras lideranças civis e religiosas.
Eis, porém, que agora tal tentativa
de implementar esta ideologia volta a assombrar as famílias na votação do Plano
Municipal de Educação (PME), ou seja: os vereadores de nossos municípios terão
– em suas mãos e consciência, diante de Deus e dos que os elegeram – a difícil
missão de rechaçar (caso já esteja presente no texto a ser votado) o que não
corresponder à verdade, ou seja, a ideologia de gênero, em seus respectivos
municípios. Os legisladores deverão estar atentos, pois se no plano federal não
existe essa consideração, será incoerência colocá-la no Plano Municipal. Esta
ideologia é de matriz marxista, e, portanto, ateia e materialista. A história,
enfim, irá julgar esse passo.
Qual é, no entanto, em suma, o
conteúdo desta ideologia, já denunciada mais de uma vez pelo Papa Bento XVI e
agora pelo Papa Francisco, que nos leva, como Bispo, a nos pronunciarmos? –
Irmãos e irmãs, a ideologia de gênero é malévola em si mesma e tem objetivos
bem definidos para a destruição da humanidade.
Deseja ela que se ensine – na
teoria e na prática – aos alunos que o sexo biológico dado pela natureza não
tem valor algum. Portanto, ninguém nasceria homem ou mulher, mas, sim, um
indivíduo indefinido que, obviamente, definiria com o tempo, se deseja ser
homem, mulher ou neutro (nem um nem outro), independentemente de suas
características fisiológicas.
Deste modo, fica patente que os
professores ou demais funcionários de um estabelecimento de ensino não deveriam,
caso a ideologia de gênero entrasse em vigor legalmente – se nada for feito – chamar
os alunos pequenos de menino ou menina. Isso seria opressão, uma vez que eles
ainda não teriam decidido o que serão. O mesmo vale para os pais. E mais: ambos, pais e professores, poderiam
com o tempo, ser punidos pelo Estado se, de acordo com a lei natural e o
bom-senso, insistissem em chamar e tratar seus filhos e filhas como tais, ou seja,
como menino e menina, e, por conseguinte, homem e mulher.
Depois de derrubar artificialmente
as barreiras da diferença sexual natural entre homem e mulher, de modo especial
a partir das escolas e de alguns meios de comunicação social com programações
específicas, chegar-se-ia à destruição da família. Esta já não deveria ser mais
um núcleo natural formado por um homem e uma mulher (cf. Catecismo da Igreja Católica n. 2201-2203), mas, sim, “qualquer
aglomerado de pessoas”.
Estaria aberta, em diversos níveis,
a porta para as afrontas ao matrimônio, união natural e, para nós que cremos,
também querida por Deus e elevada a Sacramento. Isso inclui, por exemplo, a
equiparação de uniões de pessoas do mesmo sexo com o casamento; da bestialidade, uma vez que já há quem
defenda (lembremo-nos do especialista em bioética Peter Singer) a não
discriminação do consórcio carnal do ser humano com animais irracionais, desde
que o animal não sofra maus tratos,
bem como o edadismo ou o etarismo, muito presentes nos Estados
Unidos, a proclamar abertamente um tipo de “amor” hoje condenado como
pedofilia: o ato sexual entre adultos e crianças de qualquer faixa etária (cf.
cf. J. Scala. Ideologia de gênero. S.
Paulo: Katechesis/Artpress, 2011, p. 65-67).
É diante desse quadro sombrio que
a Igreja, perita em humanidade, ergue a sua voz para, mais uma vez, apesar de
incompreendida por alguns, defender a dignidade humana, ameaçada por ideologias
contrárias à natureza e, consequentemente, aos planos de Deus. Tão opostas que
o Papa Francisco tem rotulado-as como “diabólica”,
dado que visa a subverter os planos divinos, colocando a criatura no lugar do
Criador.
Apelamos, pois, muito cordialmente,
a todos os irmãos no santo Batismo e demais homens e mulheres de boa vontade
para que fiscalizem as votações do PME em seu município, e tudo façam, ordeira
e pacificamente, para impedir que a absurda e antinatural ideologia de gênero
penetre em nossas escolas. Eis um dever de consciência decorrente da fé que
professamos e que não pode ser traído em momentos como este, no qual somos,
especialmente, convocados a ser sal da terra e luz do mundo (cf.Mt 5,13-14).
Que a Virgem Maria, invocada sob
o título de Senhora Aparecida, guarde a todos nós, as nossas crianças, seus pais
e educadores profissionais, agora e sempre. Amém!
Orani João, Cardeal Tempesta, O.Cist.
Arcebispo
Metropolitano de São Sebastião do Rio de Janeiro, RJ